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Foto do escritorNara Guichon

Uma vida com menos lixo: redução de resíduos e consciência ambiental




Os dados sobre a produção de lixo no Brasil são alarmantes. Segundo a ONG WWF o país produz quase 12 milhões de toneladas de lixo plástico por ano. Isso é o equivalente a um quilo de plástico por pessoa por semana.


Dessa quantia, estima-se que apenas 1% do plástico seja reciclado. A maioria vai parar nos aterros, lixões, rios e praias, contaminando biomas e destruindo por completo diversas cadeias vivas.


Somos hoje o quarto maior produtor de lixo plástico do mundo e estamos nas últimas posições quando o assunto é reciclar ou reduzir o descarte de resíduos. Uma alta produção de resíduos combinada com uma baixíssima taxa de reciclagem só pode resultar em uma coisa: estamos transformando nossa riqueza ambiental em lixão.


Podemos apontar diversos culpados para a má gestão do lixo em nossas cidades. Esse certamente é um problema de ordem legislativa, bem como também é um problema social e econômico. Mas a nossa relação com o descarte também é cultural.


É fato que somos um país culturalmente atrasado no que se refere ao modo como compramos, usamos e descartamos as coisas.


Vale lembrar que ainda é preciso fazer campanhas do tipo “não jogue lixo no chão” – um ato que deveria ser considerado básico para qualquer sociedade civilizada. Numa escala maior vemos que o brasileiro acredita que o que não tem mais utilidade deve simplesmente desaparecer de sua frente.


Não medimos o impacto de nossas decisões de compra e vivemos numa sociedade falsamente limpa, quando na verdade toneladas de lixo jazem por detrás das ações da indústria e do comércio.


O erro do conceito de lixo


Estive recentemente num evento em São Paulo com os catadores de materiais recicláveis e me surpreendeu o fato de que o problema maior da seleção dos resíduos comece ainda em nossas casas. Por conta da falta de consciência da população cabe aos catadores realizar um trabalho que nós mesmos poderíamos fazer com muito menor esforço.



Os catadores alertaram para o fato de que a maioria das pessoas simplesmente se recusa a separar minimamente seu lixo. O habito de jogar tudo na mesma lixeira acaba por reduzir drasticamente a quantidade de lixo que poderia ser reciclado. O resultado: degradação ambiental sem limites e um terrível impacto social, pois os catadores são privados de renda básica.


Pequenos gestos como lavar as garrafas plásticas ou não despejar comida juntamente com os resíduos sólidos gerariam uma mudança significativa na vida dos catadores. A separação correta dos resíduos domésticos não é apenas boa para o planeta, mas ajuda ativamente na renda de centenas de famílias que dependem da reciclagem para viver.



Disso tudo tiramos a lição de que na prática não existe lixo. O que existe é um direcionamento incorreto dos resíduos. Obviamente existem resíduos de difícil reciclagem, mas no geral tudo pode ser reaproveitado, retransformado e recriado.

RI 07/03/2012 – Aterro Jardim Gramacho, considerado o maior aterro da america latina. Foto Pedro Kirilos / Agencia O Globo

A questão é que para a maioria das pessoas a lixeira é como um buraco negro mágico onde cascas de ovos, pilhas, sacolas plásticas e folhas de papel somem sem deixar vestígios. Para compreender o quanto é errado não separar o seu lixo, imagine a mais banal folha de papel jogada na lixeira.


Ela demorou semanas para ser criada. Sua matéria-prima passou por um processo complexo de industrialização e cada vez que você simplesmente joga o papel no lixo, cria-se uma nova demanda por mais árvores, mais combustível e mais água para a criação de mais uma nova folha de papel. É um ciclo perverso e que cobra um preço ambiental e social muito alto.


O perigo do falso sustentável


Um estudo realizado pela ONG de defesa do consumidor Idec apontou que cerca de 48% dos produtos rotulados como sustentáveis ou amigos do planeta são na realidade falso sustentáveis – produtos com compostos químicos pensados para mascarar o verdadeiro dano ambiental.


A prática também conhecida como “greenwashing” tem sido muito usada por empresas que prometem reduzir a produção de lixo no planeta. Um bom exemplo são os copos plásticos descartáveis classificados como biodegradáveis. Na verdade, a maioria desses produtos ainda é feita de petróleo com um aditivo químico que acelera a decomposição, mas não elimina os resíduos. Ou seja, o copo pode ser decomposto em até 2 anos, mas a pegada de carbono sujo continuará no planeta.

Copos biodegradáveis da marca EeCoo. Feitos de amido sem presença de petróleo. Fonte: Eecoo.com.br.

O mesmo se aplica a diversos produtos como sacolas plásticas, canudos, sacos de lixo e embalagens plásticas ou de papel. É importante conferir as certificações e selos dos órgãos de controle internacional antes de acreditar no que a indústria diz (você pode saber mais sobre a certificação biodegradável aqui).


Economia circular


O mesmo relatório da WWF aponta que 7,7 milhões de toneladas de plásticos são despejadas anualmente em aterros sanitários. Os aterros são talvez uma das invenções mais sórdidas do capitalismo moderno. Ele cria a ideia de que o lixo está no seu “lugar correto”, quando na verdade trata-se apenas de uma forma de varrer para debaixo do tapete o efeito colateral horrendo que o capitalismo causa no planeta.


Na contramão dessa visão o engenheiro químico alemão Michael Braungart cunhou a expressão cradle to cradle, ou “do berço ao berço”, para se referir a uma nova forma de criação de produtos levando em conta o seu ciclo dentro do meio ambiente.

Modelo capitalista de economia linear: inconsequência e degradação. Fonte: Ideia Circular.


Nesse modelo de desenvolvimento e visão social os artigos são criados para serem reciclados por completo. Nenhum elemento, de nenhum produto seria simplesmente “jogado fora” – cada uma de suas partes e componentes seria reciclada infinitamente, reduzindo ao máximo a produção de lixo no planeta.


Modelo de economia circular: valorização da reciclagem e respeito ao meio ambiente. Fonte: Ideia Circular.



Essa não é apenas uma boa ideia para a ecologia, mas um excelente modelo de economia justa. Ainda segundo a WWF mais de 1 milhão de toneladas de plástico simplesmente não são recolhidas anualmente. Esse material, se devidamente reciclado, poderia se converter em fonte de renda para diversas famílias.


O que podemos fazer para reduzir a produção de lixo


O movimento zero lixo se tornou mais popular na internet com o trabalho da francesa Bea Johnson, autora de um blog e um livro sobre o assunto. No Brasil a publicitária Cristal Muniz criou o blog Uma vida sem lixo para compartilhar sua rotina desafiadora de viver gerando o menor percentual possível de resíduos. A ativista carioca Fernanda Cortez do blog Menos um lixo é outro exemplo de engajamento na causa contra a produção de resíduos.


Pratique a reciclagem


Reciclar o lixo é talvez a ação de maior poder de transformação no que diz respeito ao futuro do planeta. Mais do que uma ação governamental, a reciclagem é uma mudança estrutural e cultural da nossa relação com o consumo.


Projetos de reciclagem existem em todo o Brasil (nesse site você pode conferir os principais mapas de reciclagem). Tudo depende de que os indivíduos criem o habito de separar seus resíduos da maneira correta e destina-los aos catadores e associações competentes. Além do ganho ambiental, a reciclagem estimula a economia local e a geração de renda.


Sacolas recicladas feitas com redes de pesca do ateliê Nara Guichon. Podem ser adquiridas loja online Positiva ou contato direto com a criadora.

Valorize a qualidade dos produtos artesanais


O consumo de massa, baseado em produtos de baixa qualidade, é um dos grandes estimuladores da poluição ambiental. No caso da indústria da moda essa relação é ainda mais degradante.


Além da prática do trabalho escravo a chamada fast fashion cria um ciclo vicioso de degradação ambiental. Primeiro com o lixo industrial e químico gerado na produção das peças, segundo pelas próprias peças, feitas para durarem pouco.


Ao optar por produtos artesanais e locais você estará colocando fim a essa máquina de criação de resíduos. Produtos artesanais são pensados para durar, ou seja, há menos gastos de materiais e menor criação de descartes.


Pratique a compostagem


Quando falamos em reciclagem há quem pense apenas em plástico, metais, vidros e papel. Não podemos nos esquecer que os resíduos orgânicos são outro problema urgente em nossa sociedade. O lado bom é que podemos transformar cascas, sementes e alimentos descartados em adubo.


Já existem diversos modelos de compostagem, tanto para quem vive em casas ou apartamentos. Existem diversos tipos de composteiras e técnicas de acordo com suas necessidades.


Só ecobag não basta


Evitar o consumo de sacolas, canudos e copos plásticos é sim um passo importante, mas não basta. Quando o assunto são as compras rotineiras o ideal é optar sempre por produtos naturais, que não dependam de embalagens. Em Paris já existe um supermercado 100% sem embalagens, onde os clientes compram absolutamente tudo no modo a granel.

Quando não for possível, crie hábitos de consumo reduzido, separe as embalagens de acordo com os materiais e tenha a consciência de que cada elemento será corretamente destinado.


Aprenda a fazer


Não faltam na internet diversas receitas de produtos caseiros eficientes, baratos e que ajudam ao meio ambiente. Material de limpeza, de beleza e higiene podem ser feitos utilizando matéria prima natural e biodegradável. Outro fator importante é reaproveitar o que estiver ao seu alcance. Potes, vidros e demais utensílios podem ser transformados em objetos úteis, diminuindo o consumo de produtos poluentes.


Resumindo


Nossas decisões em relação a produção de resíduos nunca foram tão importantes. Mais do que nunca se faz necessário escolher pelo caminho da reciclagem e menor consumo.

Pequenas ações podem impactar positivamente no equilíbrio da vida no planeta. O primeiro passo é mudar a nossa visão sobre o que consideramos lixo.


Na natureza nada pode ser descartado, tudo vai parar em algum lugar e reagir com outros materiais – seja para o bem ou para o mal.


O que muitos chamam de lixo os recicladores e pensadores da nova ecologia classificam como matéria-prima. Na contramão do consumo desenfreado podemos encontrar um caminho de equilíbrio com um consumo consciente e maior respeito ao nosso planeta.

 

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